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quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Curso de Autismo

"Caro Sr jornalista da TV Utopia,

Antes de mais deixe-me agradecer o prezado convite para responder à sua entrevista, embora que de forma indirecta, pois o tempo escasseia. Mas é para isso mesmo que existem os emails.

Como sabe, sou proprietário e director de uma escola de formação há meia dúzia de anos. A ideia surgiu quando fiquei desempregado e, aos cinquenta as hipóteses de encontrar um novo emprego eram quase nulas. Foi então que apresentei um projecto ao Centro de Emprego, ao abrigo de um programa de incentivo à criação do próprio emprego e recebi de uma só vez o subsídio de desemprego a que tinha direito. Pesquisei o mercado, procurando nichos pouco explorados e pareceu-me bem apostar nos Cursos de Personalidade. Criei o "Curso de Autista" e comecei a publicitá-lo. De imediato choveram telefonemas e emails de interessados pedindo informações. Fiquei bastante satisfeito durante os primeiros meses.

Respondendo mais concretamente à sua pergunta sobre o que era ensinado: trata-se de um curso de formação da personalidade. A maioria das pessoas está insatisfeita com a sua maneira de ser e têm intenção de mudar. Por isso são tão procurados os livros e cursos que ajudam a ter uma melhor relação consigo próprios e a desenvolver a auto-estima. Pensei em enveredar por essa área, contudo o mercado está demasiado saturado de ofertas. Eu queria algo mais inovador, algo que fosse ao encontro da sociedade moderna. Já tinha ouvido falar nos Cursos de Autista e apostei nisso.

As pessoas não querem comunicar. Querem passivamente ser compreendidas, mas não estão dispostas a emanar de si qualquer mensagem. Procuram viver num mundo interior, fechado para o exterior, com interacções mínimas com este, que não compreendem nem procuram compreender. É aqui que eu entro. Se é isto que procuram, é a consegui-lo que eu as ensino.

Se é fácil? Não é o mais difícil de ensinar. Nada melhor para assimilar uma aula que uma turma motivada. Ensino-lhes como usar auscultadores e música alta para se abstraírem de tudo ao seu redor, em como a forma como se usam as palavras, abusando de neologismos, palavras caras e outras cenas que tais, pode tornar as mensagens de tal forma encriptadas que se torna impossível entender pelo interlocutor. Ensino-lhes ainda como não compreender os outros. Esta é uma coisa muito simples, embora não pareça: basta que se cultive uma outra linguagem que apenas o próprio conhece e se ignore por completo aquela que é usual entre aqueles que nos rodeiam. Mas há um aspecto muito importante a ter em atenção neste ponto: estou a falar de TODO o tipo de linguagem, não só a verbal, também a corporal e mimética. Desta forma, atingem-se dois objectivos de uma só vez: não só não se é entendido, como também não se entende os outros.

O autismo não é só isto, a impossibilidade de comunicar, interagir com o mundo exterior não se limita a deformações na linguagem, qualquer que seja o seu tipo. Há que viver no seu próprio mundo, onde não entra mais ninguém. E o quê melhor para o conseguir que inventa-lo ou refugiar-se num alternativo que encontre desocupado por aí? Há-os muitos, desde os provocados por drogas aos que se regem por valores anti-sociais.

Se a crise que Portugal vive está a afectar a minha escola? Não, não sinto isso. Tem havido uma redução de formandos nos últimos anos, mas não creio que seja da crise, até porque os cursos em questão são reconhecidos pelo Ministério da Educação e financiados pela União Europeia e dão acesso a inúmeras profissões, principalmente dentro da classe política, apetecível a qualquer um pelo poder e  recompensas financeiras avantajadas a que têm acesso. O problema aqui é outro: o problema é que parece que já toda a gente sabe como ficar autista - e não estou a falar em tomar vacinas contra a gripe A - e como tal já não sentem necessidade de frequentar os meus cursos. A sociedade já os formou e eles aprendem depressa, para mal dos meus pecados. Tenho alunos com os quais é impossível comunicar. Não atingiram já estes o grau mais elevado de formação que posso chegar a atribuir?

Tenho também alguma dificuldade em contratar formadores. No início eram os governantes e membros das elites - alguns dos mais ilustres tiraram aqui o diploma! - a desempenhar esse papel. Agora estão demasiado ocupados ou incomunicáveis para que se apercebam que precisamos deles. Por isso recorremos a políticos da oposição.

Se me é permitido gostaria de fazer um apelo: se aspira a ser rico sem trabalhar muito, poderoso e imune à lei e viver à custa daqueles que se esforçam por ganhar o pão de cada dia, não hesite em inscrever-se. Lembre-se de que tem apoio do Estado! Venha crescer connosco e fixe os olhos em quem está no topo agora: eles também frequentaram um Curso de Autismo e passaram com distinção!"

Nota: este texto é unicamente humor negro, gostaria de explicar que tenho o maior carinho e compreensão para com as pessoas autistas e gostaria muito de poder ajuda-las, a elas e seus familiares, a eliminar ou contornar o problema.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Identidades Falsas

Ver fonte da imagem:
A maioria de nós nasce e morre transitando por esta vida como se de um palco se tratasse. Porque somos todos actores, não só porque representamos papéis, mas porque usamos máscaras que nos transformam naquilo que queremos ou aprendemos a ser.
Desde o momento em que nascemos que estamos sujeitos ao processo de socialização, que muitas vezes se inicia no acto de cortar o cordão umbilical. A partir daí são-nos ensinados valores, códigos de conduta e aplicados castigos a comportamentos considerados desviantes pela sociedade. Quando nascemos, a nossa mente está vazia. Começamos a enchê-la com o que temos ao nosso redor, aprendemos e apreendemos aquilo que nos facultam, que será o que vigora na sociedade e na época em que vivemos. Mais tarde, quando começamos a ter capacidades para agir por conta própria, fazêmo-lo nos limites daquilo que nos é permitido, que aprendemos como sendo certo ou errado e enraizamos fortemente na nossa consciência.
Aquilo que somos hoje, não é mais que massa moldada na mesma forma onde o foram todos os membros da sociedade em que vivemos: a língua que falamos, o vestuário que vestimos, as leis a que obedecemos, etc.. Consoante o lugar e o tempo assim esta moldagem é mais ou menos rígida, mas o facto é que nos tormamos não naquilo que verdadeiramente somos, mas naquilo que a sociedade espera que sejamos, sob pena de sermos considerados marginais e de nos serem aplicadas medidas de coacção que variam desde a simples reprovação a penas de prisão.
Representamos diariamente papéis: somos pais, filhos, professores, alunos, jardineiros, economistas, compradores, vendedores, velhos, jovens... Todos estes papéis têm características comuns e únicas que os tornam perfeitamente definidos: todos os pais se comportam de determinada forma que não se coaduna com o comportamento dos seus filhos, ou mesmo deles próprios enquanto filhos, o mesmo acontecendo com os alunos e professores, com os velhos e com os jovens. É esperado que se actue de acordo com o papel que se detem e normalmente sabemo-lo de cor, pois levamos a vida a aprender como o representar. Mas mais do que aprender comportamentos, aprendemos o conceito do certo e do errado, do bonito e do feio, do bom e do mau, do rude e do elegante, etc.. Moldamos a nossa consciência de forma a tornar-se parte de uma muito maior, a da sociedade como um todo. Deixamos de poder ser apenas um indivíduo para passar a ser uma célula de um corpo único, do qual fazem parte outros seres humanos. O que seríamos se fossemos nós próprios? Ou melhor, o que é ser nós próprios? Será que em alguma circunstância estivemos livres da influência do que aprendemos?
Porém, todo o ser humano existe individualmente. Existe algo que ainda se mantém intacto dentro dele: a sua identidade. O que acontece é que na maioria das vezes está adormecida, foi chutada para o fundo do nosso ser e é tão constantemente empurrada para dentro pelo nosso consciente que nos esquecemos de qual ela é. Pensamos até que somos aquilo que aparentamos ser, enganamo-nos a nós mesmos. Muitas vezes a nossa verdadeira identidade é tão diferente daquela que ostentamos que se gera um conflito com consequências nefastas como depressões, doenças somáticas, desiquilíbrios emocionais e comportamentos considerados desadequados pelas normas sociais em vigor. É que geralmente o inconsciente tem mais força que o consciente e aquilo que empurramos para o dentro é repelido para fora com maior intensidade. Mas na medida em que não aprendemos a lidar com isso, nem sequer sabemos interpretar o que nos está a acontecer. Então recorremos a terapêutas, tomamos medicamentos, procuramos conselhos de amigos, etc, sempre na tentativa de repôr a normalidade, quando por vezes a normalidade que ambicionamos é construída com base numa identidade falsa. Recusamo-nos a deixar a máscara que vestimos, pois não sabemos viver sem ela. Por isso somos toda a vida actores, mesmo sem termos consciência disso. E dizem algumas pessoas que não têm veia artística!!

Lágrimas secas

Ver fonte da imagem   So me apetece chorar, mas as lágrimas não caem.... É um alívio quando elas escorrem pelo rosto, pois é uma forma de ex...

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